O vice-presidente Hamilton Mourão reiterou críticas ao orçamento secreto, esquema de pagamento de emendas parlamentares revelado em série de reportagens do Estadão. Em entrevista ao UOL, nesta quarta-feira, 17, Mourão chamou o mecanismo de "manobra orçamentária em benefício daqueles que apoiam o governo". O vice afirmou, ainda, que o Orçamento público vem sendo "sequestrado" pelo Legislativo nos últimos anos.
Há uma semana, na contramão do presidente Jair Bolsonaro, Mourão já havia defendido a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de suspender o orçamento secreto por ferir "princípios da administração pública, de legalidade, de impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência".
A modalidade de repasse de verbas para redutos eleitorais dos parlamentares permitiu ao relator-geral do Orçamento o poder de transferir as emendas do tipo RP9 para aliados do governo, sem critérios de transparência. O esquema intensificou o "toma lá, dá cá" em troca do apoio a Bolsonaro no Congresso.
Mourão negou, porém, que o orçamento secreto seja um escândalo semelhante ao do mensalão. "É totalmente diferente", disse ele, na entrevista. "O mensalão era dinheiro, como dizia (...) Quando eu morei na Venezuela, eu era adido militar lá, havia o auxiliar do adido da República Dominicana que dizia que o Hugo Chávez comprava os parlamentares a "billete limpio". Ou seja, colocava o dinheiro na mão", afirmou o general.
Para Mourão, o Orçamento é há tempos "sequestrado" no Congresso. "Essa questão da negociação se arrasta dentro desse nosso presidencialismo de coalizão. Só que uma camisa de força vem sendo colocada no governo pouco a pouco", disse o vice-presidente. "Primeiro, no governo da presidente Dilma, na situação de desvantagem em que ela estava no Congresso, as emendas passaram a ser impositivas. Depois, o presidente Temer enfrentou outra situação desvantajosa e foram as emendas de bancada. Agora, as emendas de relator".
Em outro distanciamento em relação a Bolsonaro, Mourão também se disse contrário à privatização da Petrobras. "Não acho que seja a solução", observou ele. O vice detalhou os motivos para o salto nos preços dos combustíveis, como o valor do barril de petróleo no exterior e a desvalorização do real. "O presidente tem de entender como se constrói esse preço", avaliou Mourão.
Bolsonaro costuma jogar a culpa do valor da gasolina e do diesel no colo do ICMS cobrado dos governadores e, mais recentemente, também na política de preços da Petrobras.
Eleições 2022
Mourão também afirmou que o ex-ministro da Justiça Sergio Moro, inimigo político do governo, é alguém com "luz própria" e o principal candidato da chamada terceira via para disputar o Palácio do Planalto em 2022. "Doutor Sergio Moro tem luz própria. Eu vejo ele (sic) hoje como a principal candidatura da chamada terceira via, mas vai depender de ele empolgar a massa", avaliou Mourão sobre o cenário eleitoral. "Ele tira (voto) daquele eleitor do presidente Bolsonaro que ficou desgostoso com algumas atitudes do nosso governo."
Distante de Bolsonaro, Mourão destacou, ao final da entrevista, que o papel de vice-presidente no Brasil é, hoje, de uma "figura decorativa". "Agora, o presidente compreende perfeitamente que tem a minha lealdade. Então, ele não precisa temer nada de mim. Com todas as crises que foram vividas, acredito que, se eu fosse um político de outra estirpe, teria negociado ali dentro do Congresso um impeachment do presidente. Como eu não sou, ele sabe que tem essa situação tranquila", argumentou.
A expressão "vice decorativo" se tornou popular em 2015 após o então vice-presidente Michel Temer escrever uma carta para Dilma Rousseff, à época presidente da República, em tom de reclamação. Na mensagem, Temer disse que era um "vice decorativo". Os dois acabaram rompendo definitivamente e Dilma sofreu um impeachment.